domingo, 25 de abril de 2010
ainda que sem arco-íris
Que chuva linda - ela pensou – olhando para aquele céu que parecia o palco de um teatro. As nuvens se vestiram de cortinas para apresentar naquela tarde cinza um espetáculo jamais visto – o espetáculo da solidão que sorria. Aquelas gotas representavam as pessoas que passaram, feito garoa fina. Houve atores ruins, não souberam mentir. Esses bateram de cara no vidro da janela, sem muita força, e escorreram. Outros ainda tiveram seus minutos de fama, foram granizo, fizeram barulho. Mas todos caíram no final. E ela ali, assistiu ao espetáculo sozinha e sorrindo, afinal, esse era o tema da peça. Acendeu seu cigarro e ficou lá, vendo os atores caírem por entre as cortinas de nuvens. Apreciou todas as cenas passadas e refletiu sobre a moral da história. Sorrindo, na sua solidão tema da tarde cinza.
sexta-feira, 16 de abril de 2010
a fresta de não sei onde, o raio de não sei o quê
Um fio cor de sol atravessava a sala escura. Nasceu na parte baixa do chão esquerdo, se estendia em forma de arco e morria mais laranja do que o começo na outra ponta, tal como um arco íris de um único tom. O laranja era uma linha curva e nada mais. A sala que desde sempre nunca teve janelas, portas ou pessoas, estava destinada em ser apenas uma sala de quatro paredes que juntas representavam um quadrado. O quadrado pouco cíclico, formado por cantos que nunca iriam se juntar, ângulos que dentro daquele quadrado eram tão iguais. Até o dia em que um fio laranja atravessou a sala escura pela primeira vez. O pequeno clarão produzido por aquela novidade encheu a sala de outra coisa que não o negro. Era uma luz bonita, sedutora, e em cada canto da sala era visto um degrade diferente. Agora era uma sala escura com o fio da cor do sol.
domingo, 4 de abril de 2010
a menina que pontuava
Quando menina, brincava e sonhava. Jogava com o vento, chorava na estrada. Diferente de todas as outras meninas, foi crescendo lentamente. De vez em quando, a mente estacionava e o corpo espichava. Era uma correria danada para tentar entender. Novidades, mudanças, responsabilidades. Ainda menina, aprendeu a pontuar. Começava uma história, a vivia, e colocava o seu ponto final. Sua vida fora um livro de crônicas. Abriam-na, lia um capítulo e ponto final, ali terminava uma história de criança.
Nunca deixou de pontuar. Andava para lá e para cá aflita, roendo as unhas, comendo brigadeiro, escondida em seu paradeiro de quatro paredes. Sentava atrás da porta e sorria. Ouvia sua música preferida no último volume e cantava, acelerando e aumentando a voz a cada refrão. Duas vezes. Atrás da porta também chorou, como sempre, suas lamúrias. Ficou doida. Passou por dificuldades. A porta era sua amiga. Ali, aquela madeira sem tinta e sem vida, era sua melhor amiga. Nela, espelhava e vivia. Dançava e pulava, fazia suas caras e bocas. Se enraiveceu. Xingou a porta. Ela ficou de lado. Era o sinal da nova fase, do outro capítulo. Ponto na crônica. Era uma vez.
Mais crescida, abandonou a imaginação. Pegou e sentiu o real em um tapa que, de soslaio, a assustou. Resolveu procurar e enxergar. Andou sozinha, de mãos abertas para o vento. Voou com ele. Sentiu seu coração desacelerar, a tristeza chegar, o amor nascer, a doidera crescer. Já tinha lá os seus 16 quando descobriu a paixão. Bebia sem parar. Sua nova amiga já estava lá. Resolveu parar. Tinha uma vida e uma história nova para formar. Jogou um ponto e foi feliz para uma nova aventura, que poderia ser grande, diferente e final.
A história já começou pontuada. Foi toda errada. Indisciplinada. Sábia. Demorou tempo demais para se formar. A ingenuidade batia à porta e dizia que era companheira e confortável. Abraçou a causa. Fechou os olhos para aquilo que o mundo jogava em sua cara. Rebatia, assustada. Acreditava nas pessoas. Acreditava. Uma astróloga pegou a menina em um bate papo descrédito. Narrou o seu nome de muitas letras. Contou sua idade. Refletiu e olhou assustada. "Você sabe o que te espera daqui pra frente, não sabe?". Com uma lágrima limpa escorrendo na face, enrubesceu, apoiada na mesa com o peito dilacerado. Era um novo tempo. Um tempo que não era seu. "Cuidado, garota de roupa vermelha. Você tem um dom, não o jogue fora. Não o enterre". Pode deixar. "Seu erro ainda vai ser confiar nas pessoas com facilidade demais". A menina já sabia. Já sofria. Já escondia. Era hora do ponto, mas este ela quis segurar.
Em devaneios de pesadelos, suores noturnos anunciavam o futuro mais que certo. Era tempo de sofrer sozinha. Era tempo de abraçar o orgulho. Era tempo de ser viva. Nunca mais a garota iria confiar em alguém. As vestes tristes diziam que ela seria esquecida um dia. Estava escrito. Ela sabia, porque ela podia ver. Ela via pessoas, ela ouvia conversas, ela fofocava assuntos, ela jogava o maduro. Foi de galho em galho que descobriu um jeito de sair dali. Acreditou que não era preciso viver de passado. Pontuou, de forma brusca e exata, mais uma crônica. Acreditou.
Começou a jogar e a dançar a lambada das mentiras. Jogou aqui, jogou acolá. Conversou com quem quis sem se mostrar. Descobriu verdades profundas, descobriu medos passados. De tempo em tempo, o ponto lhe voltava à mente, mas sempre fora esquecido. Esse último, de tão importante, ficou imponente. E tudo foi passando. A garota foi deslumbrando. A outra parte foi se mostrando. O mundo foi abrindo. E é assim, no gerúndio mesmo, na vida andando, que ela descobriu que não podia controlar aquilo tudo. Era jeito. Era identidade. Era criação. Era insegurança. Era a vida entrando pela antiga porta.
Ta aí. Uma nova história, um novo caminho, um novo percurso. Com tudo mais claro, desconfiada, segue no trabalho. Quem sabe, assim, ainda querendo ser amada, um dia não cai em um achado, desolado, querendo seu abraço. É primavera e eu te amo. É verão e eu te odeio. É inverno e eu preciso. Virou primeira pessoa, virar história real. Ainda sonha.
Essa garota, esquecida do seu ponto que não termina, começou essa nova jornada. Sentou atrás da porta desenhada. Sorriu para todas as suas mais doloridas mágoas. Tomou o seu banho. Sorriu de novo e de novo, e ainda não deu ao livro um fim.
Nunca deixou de pontuar. Andava para lá e para cá aflita, roendo as unhas, comendo brigadeiro, escondida em seu paradeiro de quatro paredes. Sentava atrás da porta e sorria. Ouvia sua música preferida no último volume e cantava, acelerando e aumentando a voz a cada refrão. Duas vezes. Atrás da porta também chorou, como sempre, suas lamúrias. Ficou doida. Passou por dificuldades. A porta era sua amiga. Ali, aquela madeira sem tinta e sem vida, era sua melhor amiga. Nela, espelhava e vivia. Dançava e pulava, fazia suas caras e bocas. Se enraiveceu. Xingou a porta. Ela ficou de lado. Era o sinal da nova fase, do outro capítulo. Ponto na crônica. Era uma vez.
Mais crescida, abandonou a imaginação. Pegou e sentiu o real em um tapa que, de soslaio, a assustou. Resolveu procurar e enxergar. Andou sozinha, de mãos abertas para o vento. Voou com ele. Sentiu seu coração desacelerar, a tristeza chegar, o amor nascer, a doidera crescer. Já tinha lá os seus 16 quando descobriu a paixão. Bebia sem parar. Sua nova amiga já estava lá. Resolveu parar. Tinha uma vida e uma história nova para formar. Jogou um ponto e foi feliz para uma nova aventura, que poderia ser grande, diferente e final.
A história já começou pontuada. Foi toda errada. Indisciplinada. Sábia. Demorou tempo demais para se formar. A ingenuidade batia à porta e dizia que era companheira e confortável. Abraçou a causa. Fechou os olhos para aquilo que o mundo jogava em sua cara. Rebatia, assustada. Acreditava nas pessoas. Acreditava. Uma astróloga pegou a menina em um bate papo descrédito. Narrou o seu nome de muitas letras. Contou sua idade. Refletiu e olhou assustada. "Você sabe o que te espera daqui pra frente, não sabe?". Com uma lágrima limpa escorrendo na face, enrubesceu, apoiada na mesa com o peito dilacerado. Era um novo tempo. Um tempo que não era seu. "Cuidado, garota de roupa vermelha. Você tem um dom, não o jogue fora. Não o enterre". Pode deixar. "Seu erro ainda vai ser confiar nas pessoas com facilidade demais". A menina já sabia. Já sofria. Já escondia. Era hora do ponto, mas este ela quis segurar.
Em devaneios de pesadelos, suores noturnos anunciavam o futuro mais que certo. Era tempo de sofrer sozinha. Era tempo de abraçar o orgulho. Era tempo de ser viva. Nunca mais a garota iria confiar em alguém. As vestes tristes diziam que ela seria esquecida um dia. Estava escrito. Ela sabia, porque ela podia ver. Ela via pessoas, ela ouvia conversas, ela fofocava assuntos, ela jogava o maduro. Foi de galho em galho que descobriu um jeito de sair dali. Acreditou que não era preciso viver de passado. Pontuou, de forma brusca e exata, mais uma crônica. Acreditou.
Começou a jogar e a dançar a lambada das mentiras. Jogou aqui, jogou acolá. Conversou com quem quis sem se mostrar. Descobriu verdades profundas, descobriu medos passados. De tempo em tempo, o ponto lhe voltava à mente, mas sempre fora esquecido. Esse último, de tão importante, ficou imponente. E tudo foi passando. A garota foi deslumbrando. A outra parte foi se mostrando. O mundo foi abrindo. E é assim, no gerúndio mesmo, na vida andando, que ela descobriu que não podia controlar aquilo tudo. Era jeito. Era identidade. Era criação. Era insegurança. Era a vida entrando pela antiga porta.
Ta aí. Uma nova história, um novo caminho, um novo percurso. Com tudo mais claro, desconfiada, segue no trabalho. Quem sabe, assim, ainda querendo ser amada, um dia não cai em um achado, desolado, querendo seu abraço. É primavera e eu te amo. É verão e eu te odeio. É inverno e eu preciso. Virou primeira pessoa, virar história real. Ainda sonha.
Essa garota, esquecida do seu ponto que não termina, começou essa nova jornada. Sentou atrás da porta desenhada. Sorriu para todas as suas mais doloridas mágoas. Tomou o seu banho. Sorriu de novo e de novo, e ainda não deu ao livro um fim.
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