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domingo, 17 de setembro de 2017

como um gato

tem noite que fico como um gato, 
deitada na janela,
observando as luzes da cidade,
as estrelas no céu,
pensando sobre cada ponto,
cada virgula, 
cada letra,
cada palavra,
que toda aquela vida ali logo abaixo e acima de mim, 
me dava pra pensar na minha,

nessa minha vida de gato.

segunda-feira, 10 de julho de 2017

about a part of love:


I wanna cook
whatever you feel like eating.
(when you’re high).

domingo, 2 de julho de 2017

Parte II.

Roadtrips.

“você é minha road trip favorita”. 
(pensou em usar essa frase em uma postagem de um futuro próximo).
antecipar alegrias tem sido seu passatempo favorito, 
desde que o conheceu.

aquele clichê:
moreno bonito, 
olhos verdes, 
sorriso que faz até apertar
no peito.

e tinha mais, ainda
flores, cartão, presentes
video-game, pipocas, conchinhas
madrugadas querendo, conversando, sorrindo
pinta de soldado, 
e uma cabeça no mundo da lua.

eita. 

houve um momento em que ela não acreditou.
“será que eu posso ter sorte assim?”

assim.

ela olha pra ele no carro,
ao lado dela
musicas escolhidas a dedo,
tocando alto

e o sol batendo por trás da silhueta dele.
“fica bem ai que essa luz tá tão bonita”

clic.

quarta-feira, 7 de junho de 2017

das coisas que não se apagam

No fundo da tela a tal da mensagem:
minúscula em um celular
falava de um tal de amor imenso
nem pra ser em papel de carta
pra deixar amarelar

a mensagem piscava
pela luz escassa
rolando debaixo do meu dedo
essa tal de tela touch:
um toque e tudo pode desmanchar

E não haveria durex para remendos
nem papel picado no lixo
só um botão, e não haveria rastros
a tecnologia sem querer inventou amor etéreo:
a virtualidade deixou as palavras desnudas de corpos.

Posso deixar então, por ora
o amor amado
guardado na memória do aparelho
há outras coisas por dentro de mim
que precisaram ser arquivadas

Ah benzinho, de todas as palavras trocadas
de todos os exageros incontidos
de todo o silêncio confortável
essa mensagenzinha nanica
é a minha favorita.

segunda-feira, 5 de junho de 2017

o homem mais alto do mundo

Ele era o homem mais alto que eu já havia visto na vida. Muito alto. Alto de não caber nos lugares, alto de ter que andar curvado no metrô, alto de tudo. Um gigante na terra de estaturas medianas. E como não ser notado? Aquela massona se deslocando pelos espaços, ocupando quase tudo, com sapatos quase irreais, imensos a pisar no chão, aquele olhar manso de bichão assustado, maldita indiscrição de tamanho. Tinha outros olhos diante do mundo, devia enxergar uma outra linha de horizonte, olhos que viam poucos olhos e muitos cucurucos, e sem querer, podia prever os futuros calvos. Ele devia ter também o maior coração do mundo - pra bombear tanto sangue, precisa de um super coração. Devia caber muita coisa naquele coração, naquele estômago, naquele corpo todo, caberiam uma de mim, 2 chineses, um cachorro e um canário, pra cantar, solitário na andança. Acho também que não podia pular, imagina? Perigosíssimo. Queria perguntar como era viver em um mundo que não fora feito pra ele, mas me contive para não ser mal educada. Mas é algo questionável, não? Como é estar em um mundo que não foi pensado pra ti. Ai tem que virar tatu, se achatar, tentar encontrar um desconfortável encaixe pra caber. Tem o mundo inteiro, mas tem que caber naquele espacinho que lhe rodeia por hora. Bom, acho que não é nada muito diferente do que fazemos todos os dias. Mas enfim, nossa, ele era o homem mais alto que eu já havia visto na vida.

sábado, 25 de março de 2017

Oferece-me suas mãos vazias
enquanto brinca no meu corpo
de cavocar o peito
com uma colher.
Engole todos os pedacinhos de mim
na sua fome de afeto:
foi consumindo tudo
e ficou com um estômago repleto de mim.
Enquanto eu fiquei com ausência 
esparramada na cama
na espera de algo que preenchesse
minhas vísceras 
vazias
como suas mãos oferecidas.

segunda-feira, 6 de março de 2017

Gosto de você 
até quando fecho os olhos
todos os dias
e todas as horas
preenchendo minuto por minuto
de candura e dor
de contrários avessos
de mudez crônica
de imenso e incorrigível
indelicado e mal-educado
amor.

(engulo arranhado: 
os olhos se embargam
não sei se de sede, fome ou falta
o corpo se esquece ali 
tudo desatina em sincero incômodo 
e tudo se confunde 
enquanto gesticulo frases mal resolvidas: 
balbucio nadas
grunho em mímica
pois não tenho coragem 
de romper o silêncio. 

outro dia eu me larguei encostada na janela do metrô, queria ser conduzida por caminhos retilíneos, queria observar as coisas fora de mim: espiava o mundo passar rápido, espiava o livro da mulher ao lado, eu
queria comer as páginas todas, meu estômago doía de fome, ele queria comer as páginas e me preencher de ecos alheios de um amor fictício. 
e que passa rápido. 


"pula no trem", "pula do trem".
deita na linha e espera. 
morreatropeladaeexplodeopeitooarrastandonochão.
para tudo virar a mesma coisa. 
os pedaços teriam gosto de choro.
daria para raspar
raspar tudo com uma colher 
e colocar em um pote: 
aflição em conserva
era só choro na vida, essa daí: 
o bom sempre me escorre
feito suor no corpo em dia de sol. 
brota dos poros e ensaia a queda
escapa na risada: 
por isso não estou muito de sorrisos
nem de risadas
nem de nada:
não sou de nada
tirando essa troglodice dita amor 
que insiste em me rasgar as paredes 
da boca
e do estômago).

sábado, 25 de fevereiro de 2017

sobre o peso das coisas

Navego sem saber se o que me embrulha o estômago é o curso do barco ou as sílabas que se agitam furiosamente querendo criar falas para sentimentos mal-entendidos. Brotam na garganta com uma voz estranhamente conhecida, mas saem do corpo como que em outro idioma - eu não entendo o que quero dizer a maior parte das vezes.

Both just wanted a happy end,
and they collided into each other. 

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2017

sobre marejar

E agora me pego com água transbordando dos olhos, algo parecido com choro mas que não o é. É marejamento: a prática de limpeza que extirpa por todos os orifícios o que insistia em não abrir espaço. É diferente do choro, pois é como se o choro lidasse com algo que ainda está colado, e esse marejamento lida com o que já descolou. 
Os romanos tinham uma coisinha chamada lacrimatório, no qual marejavam ou choravam dentro e o abandonavam nas sepulturas de quem fora dar uma volta do lado de lá. Uma vez, quando bem mais nova, me deparei com um destes em um museu, e achei que os romanos guardavam as lágrimas para temperar comida. Havia algo de boticário naqueles vidrinhos, mas não entendia que provinham, em grande parte, não do tempero, mas da destemperança. Por achar isso, experimentei chorar sobre o prato de comida uma vez e senti as tripas revirando da angústia que voltava pra casa: a casa da qual havia sido expulsa. No fim, entendi que, chorando ou marejando, as lágrimas são para o abandono. Elas despencam-se em um movimento suicida e espatifam-se nas mais variadas superfícies, manchando papéis de cartas, legitimando o infortúnio da despedida ou da desmedida voracidade com que devoramos nossos afetos.
Mas digo tudo isso porque hoje meus olhos marejam, e não choram. Marejam em uma enxurrada líquida e sem peixes. Sentindo descolar, descosturar, desatar, desmanchar, desabotoar e tudo o que é inverso ao que o verbo se propõe. Todos os excessos que carrego como uma roupa fora de estação. E como tudo o que rompe é dolorido - há melancolias tão físicas quanto um quebrar de costelas - nesse exato momento me pego marejando o oceano interno. Assisto evaporar gota por gota do que na garganta parecia tão sólido - erro comum: confundir o estado das coisas. Sinto que no meio disso tudo houve algo de choro, mas me escapou. Por ora marejo.

Caso alguém escorregue em mim derramada por ai... é que navego de dentro pra fora.

quarta-feira, 1 de fevereiro de 2017

a ironia de ser forte

é colocar tijolo por tijolo
feitos de 'vai ficar tudo bem'
que quanto mais o muro cresce
mais fica escuro do lado de dentro.

segunda-feira, 30 de janeiro de 2017

concerto paulistano

Daria pra escrever um poema sobre estar no metrô ouvindo Vivaldi no último volume. Toda aquela música apenas dentro de mim.