Hoje amanheci crua.
Meu café está muito quente e minha língua queima toda vez que bebo um pouco. E não me importo. Me queimo. Vai queimando dentro de mim todos os resquícios de fragilidade que ainda restavam. Eram resquícios apenas. Sobra a rigidez implacável de mulher. Sinto-me tão mulher hoje! Não menina: mulher. E minha pontuação nem sempre é compreensível. Aprendi com Clarice, que dizia que a pontuação é a respiração da frase.
Respiro assim. Pausadamente, cortadamente. E o ar que entra e sai dos meus pulmões também é assim. Cheio de fragmentos, cheio de grãos. E é arenoso. O que faz com que eu me queime mais com meu café, numa tentativa deplorável de acabar de vez com o que resta de mim.
Sou um ser inconstante. Se não souber conviver comigo, sugiro que afaste-se. Eu não mudo. Eu me respeito. E estou morrendo a cada segundo, morrendo dentro de mim mesma e das minhas veias que pulsam desesperadamente.
Aprendi que nesta vida o que nos resta é a morte.
Assim eu não gosto, neguinha.
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